10.12.07

Devaneios recíprocos.

Ela pensou nele antes de dormir, ele sentiu uma pontada no estômago quando a viu.
Ambos sabiam - estavam ligados de alguma forma.
Ela desacreditou do amor há tempos, a razão a sustentava, não sem dor.
Ele, entre tantas que lhe apareciam, desaprendeu a valorizá-las. Poucas eram as que mereciam. Ele não sabia selecionar.
Ela se perguntava o nome dele, se perguntava o que ele fazia. Ele não era bonito.
Ele viu nela alguém diferente. Alguém do outro extremo. De outra realidade.
Pertencente a um outro quadrante. viam-se opostos, e isso os atraía.
não é o clichê do 'opostos se atraem'. é o desejo visceral de completar o que falta em si, de encaixar-se na parte contrária. mas sabiam que ao fim da temporada de espetáculos jamais se reveriam, sabiam que jamais se tocariam. era uma agonia o que os preenchia, mas era alívio também. era bom devanear.

A beleza dela era diferente, era marcada pelo que havia por dentro.
O que ele queria era saber o que há por dentro. E o que há por fora.
O elo que os ligava era mais que físico, mas era físico também. Ele a desejava.


Ele dançava, ela era atriz.
Se encontraram por obra do acaso. No camarim, ela fitava o chão, dentro de seu próprio universo.
Ele notou que ela não estava bem - como notara?


- A gente trabalha com o corpo. O corpo não mente.
Foi essa a justificativa que ele deu. Ela se surpreendeu. Quis passar a noite a explicar-lhe o que a angustiava. Quis pegar-lhe a mão e pôr em seu rosto - tal repentina vontade de sentir a textura da sua pele. Demorou um minuto pra responder, em que se olharam. Ambos curiosos, ela tímida. Ele esperou a resposta, em vão. Era hora de entrar no palco - corre! 7, 8! E um tango os separou.

Ele a queria. Tentou arrancar-lhe sorrisos, sem sucesso. Mal sabia ele, que ao ir dormir àquela noite, ela sorriu - lembrando-se dele.



No último dia do espetáculo despediram-se num abraço. Com saudades do que não aconteceu.
Foi a única vez que ele a viu sorrir.

1 .:

Fragmentos disse...

esse conto me soa familiar.

:)